MPF de Campos vai investigar incineração de corpos em usina
14/05/2012 16:37
O Ministério Público Federal (MPF) de Campos instaurou nesta segunda-feira (14/05) um procedimento investigatório criminal para apurar a incineração de pelo menos 10 corpos na Usina Cambaíba durante a Ditadura Militar, conforme relato do ex-delegado da Policia Civil Cláudio Antonio Guerra, no livro “Memórias de uma guerra suja”. Na portaria que instaura o procedimento, o procurador da República Eduardo Santos de Oliveira pede que sejam expedidos ofícios à Comissão Nacional da Verdade e à Comissão Especial de Mortos Desaparecidos, requisitando informações e documentos relacionados ao caso.
Para o MPF, os agentes públicos que se excederam e cometeram crimes durante a ditadura agiram como representantes de todo Estado, e não apenas de seu segmento militar. Por isso, eventuais crimes cometidos submetem-se à jurisdição federal, havendo atribuição do MPF.
"Em um regime de exceção, pouco se pode conhecer dos procedimentos adotados para manutenção do poder. Somente com a abertura ao diálogo e à manifestação pública, podemos reaver o contato com o que nos foi negado, e buscar a verdade sobre fatos quase perdidos em um tempo de restrição às liberdades", disse o procurador Eduardo Santos, que integra o Grupo de Trabalho (GT) "Justiça de Transição". O GT, formado por procuradores da República, tem como objetivo promover a investigação e persecução penal das graves violações de direitos humanos cometidas durante a Ditadura Militar no Brasil.
A investigação do MPF está alinhada também à sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que condenou o Brasil por violações de direitos previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos nos vários episódios sucedidos no contexto da “Guerrilha do Araguaia”.
A sentença estabeleceu a obrigação do país de investigar quem são os autores materiais e intelectuais do desaparecimento forçado das vítimas, em razão do caráter permanente desses crimes, não aplicando a Lei de Anistia em benefício dos agentes de crime, nem prescrição ou qualquer outra excludente de ilicitude para eximir-se de investigar.
AUTOR DO LIVRO AFIRMA QUE A DISCUSSÃO ESTÁ APENAS NO INÍCIO
O jornalista Rogério Medeiros, um dos autores do livro ‘Memórias de uma Guerra Suja’, que traz relatos sobres às atrocidades praticadas nos anos 70 e 80 contra militantes de esquerda durante o regime militar, concedeu uma entrevista por telefone no dia 04/05 ao jornalista Carlos Alfredo no programa Band Notícias. Para Medeiros, este é o momento para se abrir uma discussão sobre o tema, pois, segundo ele, “ainda existe muitas coisas escondidas e crimes que ninguém sabe”.
“Eu acho que o Cláudio Guerra tem que pagar pelos crimes que cometeu. No livro, ele fala na primeira pessoa... Como ele matou, como fez, enfim, foi ele que apontou a Usina Cambahyba como o local de cremação de corpos de militantes políticos e destacou a estreita relação destes militares com esta usina. Havia muitos conflitos naquela região e houve uma contrapartida que não entrou no livro, que inclusive, a filha do dono da Usina talvez não tenha conhecimento. Pessoas da família dela foram assassinadas e muita gente que o Cláudio Guerra assassinou em favor da família dela”, afirmou.
Sobre a reação do ex-delegado ao retornar a Usina Cambahyba, Medeiros foi enfático ao descrever a frieza do torturador. “Estamos falando de um homem que assassinou pessoas durante 40 anos, não estamos lidando com um santo, ele foi um profissional da morte e o livro o trata assim. Quando resolvemos fazer o livro com ele, nós já tínhamos este conceito. Ele nos disse que era mais fácil queimar os corpos do que desaparecer com eles”, conta, destacando que seu objetivo foi dar início a um debate muito mais amplo sobre a questão.
“Nosso objetivo foi abrir a discussão e novos fatos serão revelados a partir de agora”, explica.
Do Ururau
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