Clínica em Campos recebe dinheiro do SUS, mas privatiza serviços
05/04/2013 12:43Do Jornal Terceira Via
Uma das três Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) em Campos – o Oncocentro, de origem particular – estaria recebendo repasses e benesses do Sistema Único de Saúde (SUS) como se fosse uma instituição de caráter público. A denúncia veio de fontes na cidade que têm acompanhado pelo jornal Terceira Via as ações da Polícia Federal que investiga hospitais públicos no Mato Grosso do Sul, oferecendo serviços de radioterapia por meio de uma empresa terceirizada e privada. Essas mesmas fontes estariam sendo obrigadas a trabalhar para a unidade particular mesmo sendo contratadas por uma unidade de caráter público.
O Oncocentro - clínica privada e especializada em quimioterapia – foi instalado em terreno que pertence ao Hospital Escola Álvaro Alvim (HEAA), de cunho filantrópico, e estaria recebendo verba do SUS por meio de Autorização de Procedimentos de Alta Complexidade (APAC). É de se estranhar também que a Unacon do HEAA não receba o nome de Álvaro Alvim e tenha o nome de uma instituição sabidamente administrada por interesses particulares – o Oncocentro. A unidade de radioterapia do Hospital Escola foi integralmente doada pelo Ministério da Saúde e será explorada – segundo essas fontes – pela iniciativa particular.
O fato se configuraria em irregularidade semelhante ao que é investigado pela Polícia Federal no Mato Grosso do Sul. A concorrência desleal e predatória não levaria em consideração as necessidades do paciente, uma vez que o Oncocentro não disporia - segundo os denunciantes - de plantonistas, cirurgiões, número de leitos compatível com a necessidade de atendimento, além de não estar apto a prover internações ou atendimento 24 h para urgências ou emergências. Essa atribuição fica a cargo do Hospital Escola Álvaro Alvim.
Estranhamente, no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (Cnes), não consta o CNPJ do Hospital Escola Álvaro Alvim. A legislação que rege a atividade determina ainda que as Unacon devem contratar os seus profissionais e não usar de subterfúgios para explorar funcionários da Fundação Municipal Benedito Pereira Nunes.
Os hospitais-escola e instituições filantrópicas gozam de certas regalias legais que os hospitais privados não têm e tampouco os serviços terceirizados nelas instalados. Nesse aspecto, a lei é muito clara.
Segundo o que revelou o deputado federal Anthony Garotinho, o centro de radioterapia do Hospital Escola Álvaro Alvim teria recebido investimentos de R$ 6 milhões do Governo Federal, via Ministério da Saúde. O próprio parlamentar anunciou ter conquistado, também junto ao ministério, a verba para a instalação de um acelerador linear – equipamento considerado a última palavra no tratamento radioterápico em oncologia – com preço de mercado de R$ 2,5 milhões.
Destaque-se a conquista do deputado Garotinho para os beneficiários do SUS. Mas é necessária uma fiscalização efetiva para que a utilização do Acelerador Linear doado pelo Ministério da Saúde não se transforme em fonte de renda de grupos privados.
Consta na fachada das obras no HEAA a marca fantasia Radgrupo – apontado como parceiro do hospital escola. Não está claro, no entanto, se o Radgrupo é uma empresa formal – visto que nem um site tem - fato que denota falta de transparência do processo. Procurado por nossa reportagem, o diretor do Hospital Escola Álvaro Alvim, Dr. Jair Araújo, disse que o responsável por todo e qualquer assunto relacionado ao Oncocentro é o Dr. Frederico Barbosa: “Eu sou apenas o diretor geral da instituição hospitalar e não há necessidade de que faça nenhuma manifestação”, disse. Por sua vez, o diretor clínico do Oncocentro, Dr. Frederico Barbosa revelou: “Eu sou o responsável pela parte técnica do Oncocentro. Portanto, os assuntos relacionados às questões contratuais têm de ser tratados com o presidente da Fundação Benedito Pereira Nunes, Dr. Márcio Sidney Pessanha”. O Dr. Pessanha afirmou que só poderia atender o jornalista do Terceira Via na segunda-feira, mas pediu que o repórter enviasse um e-mail com as perguntas que, segundo ele, seriam respondidas antes de a matéria ser publicada.
O coordenador de oncologia da Secretaria Municipal de Saúde, Dr. Israel Alecrim, não foi encontrado para comentar o caso. Integrante do Conselho Regional de Medicina (RJ), o Dr. Makhoul Moussalem declarou: “O Cremerj não tem competência nem autonomia para interferir em procedimentos burocráticos e administrativos de instituições hospitalares”. O Dr. Moussalem afirmou ainda que o órgão tem o dever de disciplinar e de fiscalizar o exercício legal da Medicina e daqueles que a exercem, os médicos. E não os hospitais.
A todos os médicos citados nessa matéria, o jornal Terceira Via cede o direito ao contraditório a quem se sentir, de alguma forma, prejudicado.